Texto © Sarah Adamopoulos
Fotografia © Rosa Reis
2015. Nasce na Graça um espaço novo. Ou, talvez melhor dizendo, renasce na Graça um antigo espaço, pois antes de existir o Damas tinha existido uma panificadora, um lugar de fazer e de vender pão. Muitas dessas pré-existências do pão – remanescências de arqueologia industrial, mobiliário de antiga padaria – integram-se agora harmoniosamente no espaço restituído à vida por Alexandra Vidal (n. 1980) e Clara Metais (n. 1982). Prova viva de que a amizade pode perfeitamente aliar-se aos negócios, o afecto e as afinidades electivas que unem Alexandra e Clara são o 'chão' do projecto Damas. Conheceram-se quando trabalhavam as duas por conta de outrem e descobriram que ambas queriam deixar de trabalhar para outras pessoas. Clara usa a palavra aliança. Aliaram-se, como quando se constrói e se promete mútuo auxílio, na alegria e na tristeza. Como quando se sonha uma coisa em conjunto.
«O TODOS é um festival que admiramos muito. Quando no ano passado o TODOS chegou ao nosso território ficámos muito felizes. Estamos no mesmo barco em termos de valores, e isso para nós é muito importante.» Alexandra Vidal e Clara Metais, fundadoras e programadoras do Damas, espaço parceiro do TODOS
Alguns chegaram-se logo à frente para dizer que tivessem cuidado, que não sonhassem demasiado alto, que não se dispusessem a ser ícaros, pois tudo no início se mostrou maior que o esperado: o espaço era maior do que aquilo de que estavam à procura, tornando maior também o desafio de explorá-lo. Fosse como fosse, trabalhavam tanto que nem tinham tempo para ouvir os profetas da desgraça. A justiça cósmica das coisas certas protegeu-as. No dia da abertura do Damas a casa estava a rebentar pelas costuras. Um mar de gente invadiu o espaço. Assim, de um projecto mais intimista, cujo espaço espelharia uma abordagem cautelosa a um público que seria de nicho, nasceu coisa diversa – numa altura em que muitas boas casas tinham fechado portas na cidade de Lisboa, na sequência dos anos mais duros que a crise do subprime infligiu à capital portuguesa.
Adaptaram pois o projecto que tinham a um espaço tão inesperado – grandemente em ruína quando pegaram nele –, pondo nisso ideias diferentes que hoje dão trabalho regular a dezasseis pessoas. Trabalho sem recibos verdes, porque abominam o trabalho precário, de que também elas foram vítimas. Por isso, uma das primeiras decisões que tomaram foi a de garantir a justiça e a segurança de um contrato de trabalho a todos quantos viessem a trabalhar com elas. Mas há outras diferenças que marcam a identidade do Damas, um espaço único em Lisboa onde se passam coisas que só ali têm lugar: primeiras oportunidades de talentos, arranques de futuros, o risco de apostar noutros sons – fora do mainstream, com um cunho underground – de arriscar no desconhecido, partindo de um apurado gosto particular que ambas têm pela música.
Agindo sobre a realidade para a transformar, o Damas programa, sem fazer concessões a facilitismos estéticos, concertos de entrada livre e democrática. No Damas todos podem entrar, sem obrigatoriedade de consumo. Espécie de mães de braços grandes, Alexandra e Clara consideram-se antes de mais programadoras. Do restaurante – esqueleto do projecto, jamais descurado, onde cabe a melhor comida autêntica portuguesa e se evoca a memória emotiva dos sabores – como do “salão de festas”. Um salão onde cabem sempre muitas mulheres. «As mulheres artistas merecem estar mais bem representadas e vale a pena ir à procura de saber quem são e o que fazem. Por outro lado, as mulheres precisam de ver outras mulheres a tocar – outras mulheres que não apenas sobem ao palco como tocam géneros musicais que supostamente pertencem aos homens, e que são pagas por isso.»
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